Bilhete postal com ilustração historiada alusiva à revolução que deflagrou na noite de 3 de Outubro, em Lisboa, conduzindo à proclamação da República Portuguesa. Constam os episódios: 1) o bombardeamento do Palácio das Necessidades; 2) a fuga da família real, na Ericeira; 3) a prisão dos Jesuítas para o forte de Caxias; 4) a proclamação na Praça do Município; 5) desembarque da Marinha no Terreiro do Paço; 6) a posição dos revolucionnários na Rotunda; 7) os elementos do Governo Provisório apresentam-se ao líder militar vitorioso, Machado Santos; sob estes, um dragão (símbolo da Casa de Bragança e do exército monárquico) jaz por terra, junto com a Coroa de Portugal; 8) os entrincheiramentos na Rotunda. A composição tomou por modelo algumas fotografias que circularam na época, por forma a criar um conjunto historiado. 1910. (9x13,8 cm).
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Caxias e a República

O forte de Caxias foi uma das prisões em que estiveram os eclesiásticos, após a revolução de 5 de Outubro de 1910, que instaurou a República em Portugal.

O livro De Artilharia 1 a Caxias – Sentido protesto de uma victima que a demagogia tratou como réu, escrito pelo Padre José Carlos Alves Vieira e publicado em 1918, descreve o que passaram os eclesiásticos, na perspectiva do seu autor, durante os primeiros dias da revolução que libertou o povo português de uma monarquia caduca e gastadora, quando foram presos e levados, primeiro para o quartel de Artilharia 1 e, em seguida, para o Forte de Caxias, cuja má reputação chegou aos nossos dias, com os hediondos crimes cometidos pela famigerada PIDE, durante a ditadura salazarista.

Começa, então, o autor, depois de lançar muitos impropérios contra os militares que conduziram os clérigos, a descrcever o modo como foram levados para o Forte desta localidade da Costa do Sol portuguesa: «os presos são descriminados em três grupos – Jesuítas, Padres do Espírito Santo e Salesianos; e todos saem da triste sala, com um soldado de cada lado, como os criminosos de mais sólida cotação e reputação.» (p. 113)

Segue-se uma descrição de Caxias, onde se fala da praia, local em que, «ao entardecer, vêm as ninfas da mitologia lavar a sua roupa suja; […] só o palácio real vale milhões (…)», e a finalizar, «outro padrão mais alto se levanta – o forte de Caxias, (…) Que bonito! Que bem situado!
Que engraçadinho! Até se estava a pintar para receber Jasuitas!» (pp. 117-118) [O autor sempre que se refere à sua companhia, escreve “Jasuitas”, que era como o povo dizia a palavra “Jesuitas”].

Para quem não conhece Caxias, diga-se que o Forte se situa num ponto alto: «quando começámos a subir a íngreme ladeira que nos devia levar ao morro do forte. Aí a canalhice, perdão, a delicadeza dos soldados achou condigno eco na multidão de todas as classes que acorria
pressurosa a admirar o belíssimo espetáculo.» (p. 123)

Após a íngreme subida que fez suar os clérigos, «Quando chegámos ao forte, íamos todos bem suados.» (p. 126), chegaram, finalmente, à «esplanada fronteira ao forte. Começa a haver ordem.» (p. 126)

O autor inicia então, uma breve descrição do local para onde tinham sido levados, dando-nos a conhecer o interior do mesmo: «A entrada no forte é graciosa e nada deselegante ou opressiva e abafadiça. Umas escadas largas dão para o corredor e andar das casernas dos soldados, Secretaria e Administração, cozinha, etc. (…) Chegados ao 1º andar, segue-se para uma esplanada, depois entrava-se noutro corredor de abóboda, e eis-nos na esplanada superior a bem pequena distância das baterias e da bandeira do forte. (…) Meteram-nos por uma escada de pedra e mandaram-nos seguir para baixo e eis-nos em pleno subterrâneo»
(pp. 128-129)

Os subterrâneos estavam cheios de Jesuítas e, com a remessa vinda de Artilharia 1, eram mais 40 e tantos. Por outro lado, já se encontravam em Caxias, os estudantes e superiores do Barro (Torres Vedras) perfazendo uma centena. A «canalha de Lisboa tentou fazer descarrilar
o comboio em Alcântara, e teria linchado os inofensivos religiosos, se os oficiais e soldados do 15 de infantaria não usassem da força, compenetrando-se deveras do seu papel de defensores dos fracos e oprimidos que devem ser.» (p. 131)

Sendo a estrutura do Forte de Caxias, aquilo que mais nos importa, não podemos deixar de citar o seguinte passo do livro que vimos analisando, onde o autor do mesmo, procede a um ligeiro confronto entre as instalações de Artilharia 1 e o Forte. Diz, então, o padre
Alves Vieira: «A casamata onde se achavam os do Barro, era longa e espaçosa. Nas duas extremidades tinha dois quartos mais retirados e um deles completamente escuro; no primeiro também estava gente, o segundo servia de casa de banho. (…) Seguindo para a esquerda de quem entra, encontra-se uma segunda caserna, apenas capaz de 10 pessoas quando muito. Depois, toma-se à direita por um longo corredor (…) e ao fim dá-se com a última caserna» (p. 133)

A comparação continua relativamente aos adereços nos dois locais, e se «Em Campolide dormíamos no tabuado simples e raso: ali [em Caxias] tínhamos um longo estrado de madeira, de meio metro de alto, e por cima um enxergão, onde, apesar de duro, se podia descansar e dormir regularmente. Além disso tínhamos travesseiro e cobertores bastantes, (…).» (p. 134)

Também relativamente às refeições se fica a saber que, «Cada um tinha o seu estojo: um copo de folha ou lata, que servia para o vinho e para a água, para o café com leite, um garfo de ferro, (…) e um guardanapo.» (p. 136)

No que concerne aos alimentos servidos, o autor informa que: «De manhã havia um prato abundante, sempre feito de géneros nutritivos (…) um ou mais copos de café com leite, (…) ao almoço davam sempre um bom pão, (…) a refeição da tarde constava de sopa, dois pratos, sendo um de peixe, e um copo de vinho. Algumas poucas vezes houve também sobremesa.» (p. 136)

A terminar, o autor informa que o Forte de Caxias se chama de D. Luís I. (p. 183)

Esperamos que, com estas informações tenhamos contribuído, sobretudo, para um maior conhecimento do Forte de Caxias que, se as suas paredes falassem, teria muito que contar, de vários períodos da História de Portugal.


José Aguiar Lança-Coelho
Licenciado e Mestre em Filosofia (FLUCL)
Escreve de acordo com a antiga ortografia

Bilhete postal com ilustração historiada alusiva à revolução que deflagrou na noite de 3 de Outubro, em Lisboa, conduzindo à proclamação da República Portuguesa.
A composição tomou por modelo algumas fotografias que circularam na época, por forma a criar um conjunto historiado. 1910. (9×13,8 cm).
  • Constam os episódios:
  • 1) o bombardeamento do Palácio das Necessidades;
  • 2) a fuga da família real, na Ericeira;
  • 3) a prisão dos Jesuítas para o forte de Caxias;
  • 4) a proclamação na Praça do Município;
  • 5) desembarque da Marinha no Terreiro do Paço;
  • 6) a posição dos revolucionnários na Rotunda;
  • 7) os elementos do Governo Provisório apresentam-se ao líder militar vitorioso, Machado Santos; sob estes, um dragão (símbolo da Casa de Bragança e do exército monárquico) jaz por terra, junto com a Coroa de Portugal;
  • 8) os entrincheiramentos na Rotunda.

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